PRÓLOGO
Um predador tem sempre sua preza dentro do seu campo de visão.
Acordara assustado, molhado de suor, havia tido novamente sonhos obscuros, e como sempre não os lembrava, mas trazia em si essa sensação constante de estranheza.
D’JÁ VU.
Sentou-se numa cadeira de frente a janela, ponderou sobre a vida, falava pouco, sempre observando, em uma constante caçada, era mesmo sem saber um predador.
É muito fina a malha que nos separa da loucura.
SEGUNDA FEIRA.
Acordou cedo e saiu como se a procura de emprego, a muito não conseguia nada, e tão pouco isso o importava, diziam-no esquisito, o que lhe causara constante desconforto.
Sempre observando e sempre observado.
Por longo tempo andou sem direção, já era quase vinte horas quando decidiu voltar, não estava cansado, tomou o caminho mais longo e deserto, o que não fazia a menor diferença, pois como sempre se sentia sozinho.
Aquela mulher ali parada como se esperasse ser abordada chamou-lhe a atenção, parou por um instante, a observou por alguns minutos, estavam sozinhos, e a rua deserta era um convite a caçada, aproximou-se em espreita.
O predador e sua preza.
Fez uma pergunta vazia na tentativa de abrir uma conversa, a rua permanecia deserta, a mulher o olhou com indiferença, mas mesmo assim respondeu dando espaço para que o assunto se estendesse agora tudo seria rápido, tudo seria fácil, em pouco tempo a levaria onde quisesse, em pouco tempo...
TERÇA FEIRA
Já passara das quatorze horas quando de súbito acordou, ligou o radio não para ouvi-lo, mas apenas por hábito, foi ao banheiro e em quanto lavava o rosto com água fria algo zuniu nos ouvidos, a voz que do radio saia atingira-lhe como um a bofetada. ‘encontrada em um beco vitima de assassinato mulher branca ainda não identificada’ sentia-se como se algo o assombrasse, uma sombra que não era a sua, semi vestido para a rua fugiu na tentativa de esconder-se, andava como que se zonzo, seu corpo não parecia lhe pertencer, avistou um rosto familiar como se olhasse em um espelho turvo, tudo girava e nada fazia sentido, o tempo já não existia, o rosto familiar havia sumido.
Quando voltou a si já passava das quatro horas da manhã, perdera o dia e não lembrava como.
Caminhou por vinte minutos ate situar-se, estava longe e descalço, mas mesmo assim resolveu voltar andando, quando chegou a sua casa o dia já raiara a muito.
Ali parado como que se o esperasse, o rosto familiar o vigiava,
Passou pela porta e no pé da escada olhou para trás e o rosto ainda o observava, subiu as escadas em fuga, entrou no quarto, tudo fora de lugar, desabou na cama e dormiu profundamente.
QUINTA FEIRA
De um salto acordou, sentou na beira da cama, olhou em volta e por fim para a janela, algo em si havia mudado estava lúcido e tranqüilo, como se tudo fosse lógico e sua vida tivesse um sentido, a paz reinava em meio à loucura, e o caos havia se dissipado como se nunca tivesse existido. Mas mesmo assim Vestiu-se sem dar por importância o quanto sua roupa estava suja, parecia um mendigo, mas isso lhe dava uma sensação de conforto, estava cheio de segurança, sentia-se forte, invulnerável, indiferente aos olhares de reprovação, estava tão seguro de si, tão seguro de tudo.
Já eram duas as vítimas, duas mulheres não identificadas, a polícia buscava evidências, algo que ligasse os crimes.
De repente ali estava o rosto familiar a refletir em uma vitrine, virou-se e tinha sumido em meio a vários outros rostos.
Pensou: ‘a morte ronda as pessoas’
Entrou em um bar pediu uma cerveja e em um gole só tomou um copo, pagou-a e enquanto enchia novamente o copo, um rosto familiar, mas de forma diferente, aproximou-se e estendeu-lhe um copo vazio, tentou falar algo, mas sua voz saiu turva e incompreensível, uma barreira invisível os separava, não falavam nem ouviam, e nesse silêncio animal tomaram cinco cervejas separadamente juntos.
De repente algo dentro de si estalou; as vozes, os cheiros, a música estridente, o suor que escorria pelo rosto, tudo o incomodava como o calor úmido de verão, precisava sair dali, correr, fugir, caçar, se esconder, o medo tomou-lhe numa mistura de sentimentos, os olhos vermelhos, a boca seca, uma mulher ali, parada, sozinha, a boca seca, a mulher ali. Correr, a mulher, tão perto, tão fácil, correr, caçar, correr...
SEXTA FEIRA
Ao longe um barulho se fazia ouvir, batiam na porta, e o som crescia, acordou, estava nu e nem se lembrava como chegara em casa, voltaram a bater na porta, agora mais firme, levantou-se sem pressa, abriu a porta, era o rosto familiar do bar, o vizinho do quarto ao lado, ‘você viu a noticia ? Acharam outra mulher morta, só que agora aqui bem próximo’ a surpresa acertou-lhe o estômago como um chute, veio na boca uma sensação de náusea entre fragmentos de memória, respondeu sem dar por conta do que falara.
‘O calor transforma as pessoas’.
O vizinho balbuciou algumas palavras e partiu corredor afora sumindo em um vão de escada, sozinho novamente o pânico se fez presente, correu ate o armário, e na gaveta de roupas embaixo de tudo pegou a arma que com a violência herdara do pai, a velha arma de seu velho pai, correu para a rua que nessa hora já estava movimentada, e com a arma em punho disparou , ouviu gritos, voltou a disparar, sentiu o cheiro do desespero das pessoas
O que lhe deu um prazer indescritível voltou a disparar. Ódio e o medo misturaram-se, covardes gritou a todo pulmão, e mais um disparo, a disparou novamente e mais uma vez e ate ficar sem munição, covardes gritou novamente, a arma em punho a luz vermelha, tudo girando, a polícia, as pessoas, um tiro... Acertara-lhe o peito
Caiu no asfalto escaldante de olhos abertos, tudo vermelho, menos o rosto familiar que o vigiava como um espelho, esta foi a ultima imagem que seus olhos registraram, e um derradeiro pensamento foi em si silenciando ‘um predador reconhece o outro... ’
Morreu as quatorze horas em um alivio de misericórdia e alegria, enquanto agonizava em um suspiro final, as pessoas já se afastavam para retomar a rotina de suas vidas,
Assim funciona a sociedade do caos, todos nos somos prezas e predadores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário